Sunday, August 8, 2010

Neura 3: Me dar conta de que fui trabalhar sem sapato!


Neura 3: De repente estou no escritório, olho para baixo e...onde estão os meus sapatos???




Muitos falam sobre síndrome do pânico. Sobre fobia de multidão, sobre medo do escuro.


Bem, eu tinha síndrome do medo da fobia da possibilidade de ir trabalhar sem sapato.


Imaginava que seria capaz de suportar qualquer coisa (um terceiro holocausto, a volta da febre axé-bahia, cama com lençol repleto de bolinhas causadas pelo uso...até sabonete com pêlo!), mas, trabalhar descalça ou de chinelo sempre foi um pesadelo que me atormentava mesmo acordada.


Perdi as contas de quantas vezes, petrificada, olhava para o banco de trás do carro, num segundo de suspense (que, francamente, parecia durar milênios), à procura do par de sapatos adequados para o trabalho...e o alívio de saber que estavam lá!


Nem era necessário ser um par novo a cada dia, na verdade minha regra com sapatos quase sempre foi: sendo de salto alto e não estando rasgado...está classificado.


Tamanho também não é necessariamente uma premissa: se o preço é competitivo, vale o famoso "pé-de-pobre-não-tem-tamanho". Não é exatamente muito seguro (levo muitos tropeções, mas é eficiente em termos de custo) :-P


Em menor escala, também tive fobia de ir trabalhar sem calça. Após refletir um pouco, entendi que minha falta de atenção não chegaria, assim, tão longe. Dessa forma, deixei de me preocupar com essa questão em particular.


Voltando aos sapatos...meu carro vivia abarrotado com pares de sapatos (os dois que eu tinha). Fiéis escudeiros, bravos guerreiros que não se envergonhavam de cumprir seu dever mesmo quando não combinavam em nada com o resto da roupa que eu vestia! Mas, eram sapatos sociais. E isso bastava.


Porém a mim não bastava viver sondada pelo temor de ir trabalhar sem sapatos. Até que chega o dia do Juízo Final. Era esse o sentimento em mim.


Lembro-me em detalhes: liguei a seta do carro, indicando que iria entrar no estacionamento. Xinguei o pedestre que andava como uma lesma e me impedia a passagem, olhei o carro ao lado, pensando em como tinha sorte de estacionar na garagem coberta, procurei com os olhos o síndico do prédio (ao mesmo tempo que aumentava o volume da música :-P), subi a rampinha da garagem, procurei a vaga costumeira, ok, estava disponível, manobrei, fui pra frente, manobrei, fui pra trás, manobrei de novo (não sou boa com balisas), olhei no chão e a faixa delimitadora da vaga não estava tão torta. Me contentei. Puxei o freio de mão e fui lentamente girando a cabeça à procura dos sapatos no banco de trás...


SA-PA-TOS....


Vi minha vida toda passar como num filme...infância jogando terra na cabeça, adolescência dando uma de intelectual, adolescência dando uma de revoltada, jovem dando uma e adulta dando uma de sem-teto!! Sem sapatos!!!???


Nada....porta-malas, porta-luvas...nada. Nem meias como uma pista de que haveria sapatos ali. Nada.


Olhei para o relógio: estava mais atrasada do que poderia estar. Olhei para o retrovisor, cruzei meu próprio olhar e fiz a coisa mais óbvia a fazer: COMECEI A GARGALHAR! De nervoso, é claro!!


Depois de muito me xingar, encarei a coisa. Coloquei minhas chinelas e fui. Nariz ao alto, cabelos ao vento! Fui!


Graças à boa alma Mariuco, troquei as chinelas por um sapato que hoje não atende mais pelo nome de sapato (está mais para "arrombado").


Mas, criatura, por que mesmo esse medo todo de ir trabalhar sem sapatos?


Era medo de não me adequar. Medo de afrontar. Medo de ter que me explicar que sou assim. Medo de achar que os outros vão achar que eu deixo de achar.


E acima de tudo: Era medo de que medissem quem sou pelos sapatos que uso (ou não).


E mesmo me dizendo tão incomum, nunca tive coragem de ir trabalhar sem sapatos. Só fui porque uma fatalidade me ocorreu. E quer saber? SINTO-ME MUITO MAIS LEVE!


Cada medo que carrego em mim me faz ver uma parte menor da vida. Me faz tentar planejar saídas para coisas que deveriam ser espontâneas. O medo me faz viver pela metade.


Desde o dia D, não tenho mais problemas em trabalhar sem sapatos. Não provoco, mas se acontecer, aproveitarei muito mais! :-P

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